A cirurgia íntima, ou ninfoplastia (labioplastia), é por definição o procedimento que reduz os pequenos lábios vaginais. Começo aqui pela definição para atualizarmos a linguagem. Por questões anatômicas e inclusivas, hoje, não denominamos como pequenos lábios e grandes lábios, e sim, lábios internos e externos.
Segundo dados divulgados pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética, o Brasil é o país campeão em cirurgias íntimas* feitas por mulheres. E o que isso significa?
Na verdade, a estatística nos mostra que as mulheres brasileiras estão muito inseguras quanto ao corpo. É sinal de que a ditatura da beleza chegou também à região genital.
Diante da alta porcentagem de mulheres que buscam a “vulva perfeita”, é frequente também a procura delas por terapia da sexualidade, tanto em meus atendimentos clínicos quanto na plataforma Sexo sem Dúvida.
Elas geralmente apresentam uma insatisfação com o corpo, uma enorme necessidade de se adequarem ao padrão estético para serem aceitas, dores na relação sexual, ausência de prazer, vergonha… Algumas que se submeteram à cirurgia reclamam da falta de sensibilidade na região, que pode, sim, acontecer por ser uma região muito vascularizada. E há ainda as que fizeram a cirurgia, mas continuam se sentindo inadequadas sexualmente.
Esse tipo de cirurgia é recomendada se os lábios dificultam a higiene, causam infecções recorrentes e provocam incômodos e dores nas relações sexuais. Ou, seja, é um procedimento indicado quando há dificuldades funcionais.
Origem do desconforto estético com a vulva
O incômodo com o aspecto da vulva tem um viés principal: a enraizada cultura da pornografia no Brasil que idealiza um formato ideal. O padrão estético “perfeito” seria aquele em que o órgão é simétrico, rosado, sem pelos e sem excesso de gorduras e pele. É de extrema importância ressaltar que sua liberdade sexual e autonomia não têm relação com uma vulva “ideal”, a perfeição, inclusive, não existe.
Se você está pensando em realizar a cirurgia, saiba que tem um caminho a ser explorado. Conhecer um pouco da sua anatomia é o começo para percorrê-lo. Por exemplo, você já olhou a sua vulva no espelho? Muitas mulheres desconhecem a própria vagina. Conhecer a própria anatomia faz parte do autoconhecimento e da autonomia sexual.
Entender que existem vulvas de diversos tamanhos, formatos e cores é essencial para se livrar desse tipo de opressão, bem como entender que em uma mulher adulta, o modelo considerado “ideal” é praticamente impossível. Ou seja, vulvas sem pelos, pequenas e rosadas são de crianças, não de mulheres.
A arte nos ajuda neste entendimento. Veja, por exemplo, “A grande parede de vaginas”. Uma grande escultura de autoria de Jamie McCaartneye, com 400 moldes de vaginas, na verdade vulvas. Outra questão de linguagem que precisa ser dita: vulva e vagina não são sinônimos. Saber como é o seu corpo e como ele funciona te ajuda na autoconfiança e na segurança para tomar suas decisões.
Diante desse entendimento, ainda assim a cirurgia íntima pode ser uma boa opção? Sim, para aquelas extremamente insatisfeitas diante da sua anatomia, as que sentem dores ou incômodos na região devido ao real excesso de pele, por exemplo.
E como saber se este é o seu caso? Considere o procedimento se você apresentar um volume muito acentuado dos lábios vaginais, dores na relação sexual e durante as atividades físicas, excesso de flacidez na região genital e desconforto com roupas apertadas.
Um bom profissional de cirurgia plástica é aquele que pode fazer uma avaliação física. E a terapia da sexualidade pode ajudar na elaboração das questões de gênero diante do sofrimento emocional e das dores sexuais de mulheres.
É necessário acolhê-las e, diante das escolhas, orientar procedimentos de forma ética e com seriedade, visando a segurança física, sexual e emocional da mulher. Existem ainda diversos outros tratamentos para a região íntima feminina. É válido pontuar que negar o envelhecimento enquanto ciclo de vida é diferente de cuidar do envelhecimento.
Para você ter paz com a sua genitália e aumentar a sua qualidade de vida e bem-estar, a avaliação psicológica se torna importante, pois mulheres que sentem nojo de sua região genital (vulva), evitam contato com a parceria e até mesmo receber sexo oral não se sentirão melhor apenas com a realização da cirurgia íntima.
Sim, uma cirurgia estética pode melhorar a autoconfiança e autoestima de mulheres, mas não tem um poder transformador por si só.
Tem, ainda, mulheres que apresentam sinais claros de depressão e de ansiedade, transtornos de distorção corporal, transtornos alimentares e dificuldades sexuais por desconhecimento corporal que buscam pela cirurgia.
O processo terapêutico visa auxiliar na compreensão dos benefícios de procedimentos estéticos e diferenciar se é apenas uma contribuição na sua autoestima ou se ajudará efetivamente na sua qualidade de vida física, sexual e emocional.
* Dados de 2020 disponibilizados em The International Society of Aesthetic Plastic Surgery. ISAPS international survey on aesthetic/cosmetic procedures performed in 2019. https://www.isaps.org/wp-content/uploads/2020/12/global-survey-2019.pdf (acessado em 12/Jul/2022).