Por Filipe Vasconcelos – O reconhecimento a um dos maiores músicos que o Brasil já teve
O dia 8 de julho de 2019 foi uma data muito dolorosa para os fãs do rock/metal, não só no Brasil, mas no Mundo. Nesse dia acordamos com a surreal noticia da morte de André Matos, aos 47 anos, vítima de um infarto. Aquele sábado ficou marcado na memória dos fãs. O negócio foi divulgado tão repentino que todo mundo desconfiou que fosse uma piada de mau gosto. A verdade devastadora veio com a confirmação da assessoria do cantor e da banda que ele estava naquele período, o Shaman.
O sentimento de todos que acompanharam a carreira brilhante do “Maestro do Metal” foi o de dor e perda. Pra mim, que teve boa parte da trilha sonora da minha adolescência marcada pelas músicas desse cara, foi como perder um grande amigo, o qual ficaria apenas as lembranças de boas coisas vividas, no caso de André, sua obra, que ecoa até os dias de hoje. Infelizmente, eu fico triste como, tanto na época de seu falecimento quanto agora, dia em que lembramos os seus 4 anos de morte, o Brasil simplesmente continua a ignorar toda a relevância e contribuição de André Matos à música.
André foi tão relevante dentro do cenário que as três bandas em que ele esteve, respectivamente, foram grandes. Sua carreira começou ainda em 1985, com o Viper. A banda, mais voltado pro Heavy Metal mais tradicional, contava com garotos que não tinha nem 18 anos de idade, mas conseguiram despontar no cenário mundial com o álbum de estreia “Soldiers of Sunrise”. Foi com o Viper que o mundo conheceu o grande cantor em formação que André já era, na época com apenas 15 anos de idade. Agudos potentes combinados com uma voz agressiva, faziam de André um destaque internacional, num período em que não existia uma cena de metal no Brasil.
Após dois discos, André fez aquilo que era impensável, e lamentavelmente, virou marca em sua carreira, deixou o Viper quando a banda estava em alta, no inicio dos anos 90. A saída teria acontecido para que ele pudesse estudar música de forma profissional, o que de fato aconteceu. André Matos era bacharel em Regência Orquestral e Composição Musical pela Faculdade de Artes Alcântara Machado. Foi na instituição que ele conheceu Rafael Bittencourt, e juntos, formaram o Angra, banda de metal melódico com influência em música erudita, que viria a conquistar o Japão e a Europa.
Com o Angra, André Matos alcançou um novo status. Graças ao reconhecimento que já tinha com o Viper, o Angra despontou com força no cenário com o lançamento do álbum de estréia, “Angels Cry (1993)”. Sua passagem pela banda rendeu outros discos, “Holy Land (1996)”, que traz como temática o descobrimento do Brasil, embalado com ritmos brasileiras mesclados ao heavy metal, e em 1998 o disco “Fireworks” um álbum onde o Angra já estava em desgaste, mesmo assim, foi nesse trabalho que André fez uma de suas músicas mais emblemáticas, a balada “Lisbon”.
Em 2000 o cantor saiu do Angra devido a divergências, hoje conhecidas pelos fãs graças ao documentário que foi lançado recentemente sobre a carreira de André Matos. Junto com outros dois ex-membros do Angra, André formou o seu terceiro e mais aclamado projeto, o Shaman. Em 2002 eles fizeram o disco “Ritual”, considerado o melhor trabalho de metal produzido por uma banda brasileira. O sucesso foi tão grande que o Shaman rompeu a bolha do gênerl, ao colocar a música Fairy Tale, composição de André Matos, em uma novela da Rede Globo, a infanto juvenil “O Beijo do Vampiro”. Ter uma música de metal tocando nas rádios do país foi algo que somente o Shaman conseguiu fazer por aqui.
Assim como aconteceu com o Viper e o Angra, mais uma vez, divergências pessoais e musicais fizeram o André deixar a banda em 2007, algum tempo depois de lançaram o segundo disco, “Reason (2005)”. Foi após o fracasso dessa terceira banda que André Matos decidiu investir em seu nome e sair em carreira solo.
Sim, o nome de André Matos era muito forte no mercado internacional. Em parte, suas bandas se sustentavam muito pelo talento de André. Seu vocal super agudo e potente deu voz à canções imortais, como Carry On, Nothing to Say, Here I Am e For Tomorrow. André Matos não era só um cantor excepcional, mas um pianista e compositor fora da curva. Muitas das músicas de grande sucesso do Angra e Shaman foram feitas apenas por ele, e repletas de elementos de composição únicos, como a Holy Land, que trazia peso, baião e axé, tudo mesclado num som único e singular.
Como resultado, o nome de André ficou gigante internacional, chegando a fazer participações com vários artistas do metal europeu, a mais expressiva foi com o projeto Avantasia, um metal opera que reuniu os principais nomes do metal europeu, e como único brasileiro, contava com André Matos, graças a sua grande amizade com o líder do Edguy, o alemão Tobbias Sammet, idealizador do metal opera.
Mesmo com um nome forte, infelizmente, isso não sustentou os últimos anos de carreira de André Matos. Entre 2007 a 2012 ele lançou três discos; “Time to Be Free (2007)”, “Mentalize (2009)” e “Turn of the Lights (2012)”, todos com excelentes canções, que passavam por todas as influências de suas antigas bandas. Infelizmente, os trabalhos solos de André Matos nunca deslancharam, talvez por uma falta de uma gestão que fizesse seu projeto alcançar novos patamares. Os membros de sua banda solo sempre apontaram a falta de um empresário forte como principal fator de sua carreira solo não ter tido o retorno que o cantor esperava. Inclusive, nesse período ele formou uma nova banda junto com um guitarrista finlandês, Timo Tolki, o Symphonia, que apesar de um bom marketing, foi um projeto que não vingou e gravou apenas um disco.
Shows menores e menor repercussão de suas novas músicas fizeram da carreira solo de André Matos algo muito abaixo da grandiosidade de seus tempos de Angra e Shaman. Nesse período também houve sua reunião com a formação original do Viper, que rendeu uma turnê muito lucrativa e um DVD, e em 2018, André se reuniu também com o Shaman, fato que colocou seu nome de volta aos holofotes de outrora. De apenas três shows, a reunião virou uma turnê e tudo indicava que haveria a possibilidade de haver um novo disco da formação clássica do Shaman. Infelizmente, os planos foram interrompidos pelo seu falecimento precoce em 2019. A sua partida também interrompeu aquilo que era muito esperado pelos fãs, sua reunião com o Angra, algo que, ao que tudo indica, tinha grandes chances de acontecer e seria do interesse de André.
A carreira de André Matos, mesmo com altos e baixos, é brilhante, cheia de canções maravilhosas e discos incríveis para os fãs do gênero. Sua perda, infelizmente, pouco foi celebrada pela grande mídia. Eu sempre achei que André Matos merecia uma matéria extensa no Fantástico, que mostrasse os seus feitos, mas isso nunca aconteceu. Um cara genial, mas que não fazia músicas que eram populares ao grande público, e com isso, poucos realmente fizeram caso de sua partida. Uma voz imortal, uma alma talentosa e dotada de sensibilidade, que resvala em toda sua obra. Mesmo após quatro anos de sua partida, o trabalho de André Matos segue imortal e relevante e ainda faz muita falta.
Eu só posso ser grato pela obra grandiosa que André Matos nos deixou. Suas músicas fazem parte da minha influência, e de certa forma, por parte do meu caráter como pessoa hoje. Em nome dos fãs, que essa semana celebraram sua partida através de suas músicas, eu posso dizer, André Matos, obrigado por tudo… E Carry On!
*O autor é estudante de jornalismo e músico